domingo, 22 de abril de 2012

Lua adversa

Um lindíssimo poema que foi a mola impulsora de um texto que escrevi, à toa, num desacerto de palavras desavindas, um amontoado frases sem sentido, sei lá...
Estaria eu, talvez, numa fase adversa da lua? Cecília Meireles, perdoa-me!


LUA ADVERSA

Tenho fases, como a lua
Fases de andar escondida,
fases de vir para a rua...
Perdição da minha vida!
Perdição da vida minha!
Tenho fases de ser tua,
tenho outras de ser sozinha.

Fases que vão e vêm,
no secreto calendário
que um astrólogo arbitrário
inventou para meu uso.

E roda a melancolia
seu interminável fuso!
Não me encontro com ninguém
(tenho fases como a lua...)
No dia de alguém ser meu
não é dia de eu ser sua...
E, quando chega esse dia,
o outro desapareceu...

Cecília Meireles




Também eu tenho fases! Como a Lua!

Tenho fases de recolhimento.

E, como se fosse uma flor, resguardada na sombra de botão cerrado, meu coração imobilizado no peito, fecha-se numa quietude sem graça, sem perfume e sem cor. Botão melancólico, contido.
Anunciação. Pressentimento.
Sou água e sou braseiro amortecido.
“ Fase de andar escondida.” De ti.

Aí sou tímida Lua Nova.


Tenho fases de revelação.

Flor que floresce devagarinho, ansiosa, palpitante de vida. Temerosa, talvez.
Grávida de cor, de perfume, de beleza. Flor que não se vê. Ainda...
Um rasto de luz, tímido e suave.. Apenas promessa. Compromisso, não.
Espreito o mundo. Onde estás...?
Sou leite e sou brasa incendiada.
Avalanche de sonhos, nas asas da Esperança.
“Não me encontro com ninguém.” Ainda...

Aí sou expectante Quarto Crescente.


Tenho fases de completude.

Flor radiosa, vibrante e delicada.
Flor de cetim, toque de veludo, esplendorosa de cor, perfumada.
Aí, “fase de vir para a rua”.
Tanta vida para viver.
Coração em sobressalto! De encantamento, de sonhos sonhados acordada, vindos de mansinho, nas asas diáfanas, verdes, da Esperança.
Verdes, como os teus olhos. Verdes, como os meus olhos.
Sou sangue e sou lume.
“ Fase de ser tua.”

Ai sou fulgurante Lua Cheia.


Tenho fases de esgotamento.

Flor cansada, lassa, corola amachucada, tombada num mole aveludado, emurchecido.
Coração tumultuado.
Já não guardo o teu perfume, começo a perder-te o rosto.
“Perdição da minha vida. Perdição da vida minha”.
Foram-se os sonhos nas asas da descrença.
Sou linfa e sou cinza.
“E roda a melancolia no seu interminável fuso”
Fase de “ser sozinha.”

Aí sou turvo Quarto Minguante.


Mas, na volta da Lua, não tarda, sou de novo Lua Nova, depois Quarto Crescente, e voltam os sonhos nas asas da Esperança sempre renascida, a seguir, sou, outra vez, Lua cheia, incandescente, brilhante... E, também sobressalto. Desacerto.
O turvo Quarto Minguante ? Não sei. Esqueci-o...





Aqui fica outro poema dedicado à Lua e suas fases.



LUA

Tens fases, és como a Lua,
quando iluminas a minha noite,
feminina, sedutora,
e te descobres,
te mostras nua,

Minguante, quando choras,
quando me esqueces,
quando entristeces,
quando foges do meu desejo,

Crescente, quando sorris,
quando me enlouqueces, ,
quando envaideces,
quando entro nos teus lábios,
és lua cheia num beijo...

JOSÉ GABRIEL DUARTE, in NO OUTRO LADO DE MIM (a publicar)

2 comentários:

José Almeida da Silva disse...

Falr de Lua, é rodar para mostrar a plenitude do ser num constante mergulhar nas suas mais profundas moradas, sempre em busca do Amor que o estrutura. E tantos são os mergulhos que a incandescência, o brilho, o sobressalto, o desarcerto, as fases, se confundem de tal modo que o Quarto Minguante desaparece na profundidade das águas.

Belíssimo, pelo inesperado final do texto-poema.

Gostei particularmente do jogo das intertextualidades e das imagens de cor e de movimento (de rotação!) ao texto. Dos poemas "Lua Adversa" e "Lua", também.

Parabéns e um abraço do,

A desalinhada disse...

Muito obrigada, querido Amigo, por me ler e pelos seus generosos comentários. Comentários belíssimos que só um Poeta, de grande talento e com um coração do tamanho do mundo, poderia escrever!! Não mereço tanto! Abraço grande e grato. M.C.