Uma vida.
Perdeu o autocarro e chegou mais tarde, ele insultou-a. Não comprou vinho para o jantar, ele bateu-lhe. Não conseguiu calar o choro do bebé, ele espancou-a. Foi despedida do emprego, ele matou-a.
Perdeu o autocarro e chegou mais tarde, ele insultou-a. Não comprou vinho para o jantar, ele bateu-lhe. Não conseguiu calar o choro do bebé, ele espancou-a. Foi despedida do emprego, ele matou-a.
Não foi sonho. No
jardim, na madrugada cristalina, um unicórnio prateado descansava, majestoso e
pensativo, debaixo da velha magnólia florida.
No supermercado.
Encheu o carrinho com a sua fome. Pagou com a mão cheia de nada. Foi para casa, que não tinha paredes, não tinha telhado, não tinha nada. Não era casa, apenas um abrigo forrado de cartão, debaixo do velho e ruidoso viaduto.
Encheu o carrinho com a sua fome. Pagou com a mão cheia de nada. Foi para casa, que não tinha paredes, não tinha telhado, não tinha nada. Não era casa, apenas um abrigo forrado de cartão, debaixo do velho e ruidoso viaduto.
É cansaço, sim!
Porque. Tu sabes que, se metade de mim é abrigo, a outra metade, é cansaço!
Mas, se outra metade eu ainda tivesse, seria amor!
A vida é feita de encontros e desencontros. Talvez, um dia,
me encontre, num desencontro teu ou tu me encontres, num desencontro meu... Ou,
quem sabe, talvez continuemos, assim, eternamente desencontrados... Mas, apesar
de tudo, ainda abraço cada dia, com a lembrança fugidia do brilho dos teus
olhos e oiço a música da tua risada, a entoação da tua voz, em todos os sons do
mundo.
O arco-íris termina
na tua alma, é aí que o procuro; A rosa só precisa desse vestido de seda que
lhe fica tão bem, mas fica ainda mais bela quando se desnuda para ti; As folhas
amarelas suicidam-se, para que novas folhas nasçam e vistam de verde e de brilho
as tuas manhãs; O céu é uma igreja imensa onde rezas e te reencontras; Essa
flor, que voa de pássaro em pássaro, chama-se coração, onde te acolhes e te
aconchegas; Esse espaço não termina nunca! É infinito... Como esta saudade de
ti.
( A propósito de um poema belíssimo de Pablo Neruda)
( A propósito de um poema belíssimo de Pablo Neruda)
A Primavera emigrou
ou esqueceu-se que este é o seu tempo. O céu ainda não está azul, pontilhado,
aqui e ali, por nuvens brancas como bolas de algodão... as arvóres, essas sim,
fortes e decididas, estão esplendorosas, em flor... nos jardins, ainda não se
anuncia a explosão de cor, perfume e encantamento, que nos embeleza os dias...
o sol esconde-se, amodorrado e
aborrecido, no pingue-pongue da chuva que teima em envolver a terra, no seu
manto cinzento e sombrio...
E, no silêncio lânguido da tarde, dei comigo a pensar que
quase já não sei como se rabisca sol...
A vida não deve ser a preto e branco, aliás, nunca é a preto
e branco. Tem de ser bem colorida, verde, azul, amarela, vermelha e roxa. Roxa,
a vida, às vezes, é. Os socalcos, as
ravinas, os tropeços, as quedas, nas pedras do caminho, deixam sempre alguns
arranhões, algumas nódoas roxas, nos nossos sonhos, na nossa alma...
Trilhamos o caminho, passo a passo; subimos uma escada,
degrau a degrau; escrevemos o poema, palavra a palavra; construímos um amor,
instante a instante; adormecemos uma saudade, lágrima a lágrima; bebemos a
vida, gota a gota... E, é só gota a gota que matamos esta sede imensa de
viver...
O mendigo era quase invisível no tumulto da rua.
Quando me debrucei para lhe dar uma esmola, ergueu o rosto para mim.
Nos olhos tristes, safiras ardentes. No sorriso leve, o esplendor do sol.
Ali, no atropelo da rua, um olhar, um sorriso, uma espantosa orgia de azul, uma inebriante bebedeira de luz.
Quando me debrucei para lhe dar uma esmola, ergueu o rosto para mim.
Nos olhos tristes, safiras ardentes. No sorriso leve, o esplendor do sol.
Ali, no atropelo da rua, um olhar, um sorriso, uma espantosa orgia de azul, uma inebriante bebedeira de luz.
A Primavera parece estar, enfim, quase a chegar. O céu está quase azul, pontilhado, aqui e ali, por nuvens brancas como bolas de algodão... as árvores, atrevidas e resplandecentes, estão já em flor... nos jardins, anuncia-se uma explosão de cor, perfume e encantamento... o sol está quase a envolver a terra, numa chuva, ainda tímida e amena, de ouro e de luz... E, eu estou quase feliz!
Às vezes, menos ainda do que uma sílaba, a falta que nos faz
uma Letra inspiradora que nos conduza
ÀQUELA palavra, com asas, mágica, que quebre o feitiço que nos tolhe,
que nos liberte e nos permita acabar o poema...
Partiste.
Começo a esquecer o teu cheiro, o som da tua voz, o toque da tua pele. Começo a perder a tua face, o brilho dos teus olhos, o sabor dos teus beijos.
Mas, mesmo agrilhoada, na aridez agreste, turva, da tua ausência, eu ainda estou inteira.
Começo a esquecer o teu cheiro, o som da tua voz, o toque da tua pele. Começo a perder a tua face, o brilho dos teus olhos, o sabor dos teus beijos.
Mas, mesmo agrilhoada, na aridez agreste, turva, da tua ausência, eu ainda estou inteira.
MC
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