Difícil fotografar o silêncio.
Entretanto tentei. Eu conto:
Madrugada a minha aldeia estava morta.
Não se ouvia um barulho, ninguém passava entre as casas.
Eu estava saindo de uma festa.
Eram quase quatro da manhã.
Ia o Silêncio pela rua carregando um bêbado.
Preparei minha máquina.
O silêncio era um carregador?
Fotografei esse carregador.
Tive outras visões naquela madrugada.
Preparei minha máquina de novo.
Tinha um perfume de jasmim num beiral de um sobrado.
Fotografei o perfume.
Vi uma lesma pregada mais na existência do que na pedra.
Fotografei a existência dela.
Vi ainda azul-perdão no olho de um mendigo.
Fotogafei o perdão.
Vi um paisagem velha a desabar sobre uma casa.
Fotografei o sobre.
Foi difícil fotografar o sobre.
Por fim cheguei a Nuvem de calça.
Representou pra mim que ela andava na aldeia de braços com Maiakovski – seu criador.
Fotografei a Nuvem de calça e o poeta.
Ninguém outro poeta no mundo faria uma roupa mais justa para cobrir sua noiva.
A foto saiu legal.
Entretanto tentei. Eu conto:
Madrugada a minha aldeia estava morta.
Não se ouvia um barulho, ninguém passava entre as casas.
Eu estava saindo de uma festa.
Eram quase quatro da manhã.
Ia o Silêncio pela rua carregando um bêbado.
Preparei minha máquina.
O silêncio era um carregador?
Fotografei esse carregador.
Tive outras visões naquela madrugada.
Preparei minha máquina de novo.
Tinha um perfume de jasmim num beiral de um sobrado.
Fotografei o perfume.
Vi uma lesma pregada mais na existência do que na pedra.
Fotografei a existência dela.
Vi ainda azul-perdão no olho de um mendigo.
Fotogafei o perdão.
Vi um paisagem velha a desabar sobre uma casa.
Fotografei o sobre.
Foi difícil fotografar o sobre.
Por fim cheguei a Nuvem de calça.
Representou pra mim que ela andava na aldeia de braços com Maiakovski – seu criador.
Fotografei a Nuvem de calça e o poeta.
Ninguém outro poeta no mundo faria uma roupa mais justa para cobrir sua noiva.
A foto saiu legal.
Manoel de Barros
O Poeta é fotógrafo sublime, sem câmara, mas com um coração feito flauta, onde Deus entoa melodias novas, diáfanas, perfeitas, cada poema, que a sua mão traça, uma fotografia íntima, delicada, onde desnuda e expõe a sua alma, cada poema uma canção, uma ode, um hino, uma sinfonia...
O Poeta tem o dom de sentir e fotografar,
na sua poesia, o sussurro mágico da melodia do Universo, nas palavras que escolhe,
harmoniza e junta. Por isso, o Poeta não sabe, mas é flauta divina, compositor inspirado, que compõe com palavras, sem pauta, sem notas de música, dó ré, mi... e sem clave de sol, ou de fá...
Paul Claudel, no entanto, disse:
“O poema não é feito dessas letras que espeto como pregos, mas do branco que
fica no papel”. Eu penso que, o poema é feito das letras que formam as palavras e
dos espacinhos incertos entre elas, onde talvez se aninhem o eco da melodia universal, o
sentimento e a emoção...O Poeta, como Manoel de Barros, neste belíssimo poema, é o fotógrafo magistral do Silêncio, do Perfume, de todos os Perfumes, da existência da lesma e e todas as existências, do azul-Perdão, do verde-Perdão, do castanho-Perdão dos olhos de todos nós, eternos mendigos de alguma coisa, do Sobre, (na verdade, como deve ser difícil fotografar o Sobre, mas o abençoado sabe!), da Nuvem de calça...Da Arte!
O Poeta fotografa, infatigavelmente fotografa, o
que mais ninguém sabe ver, aparentemente com os pés no chão, embora tenha asas
invisíveis, macias, gigantes, que o levam para lá das nuvens, rumo ao
infinito, os olhos nas estrelas, a emoção à flor da pele. Mas, é com a
cintilação da sua luz, o seu sentimento bordado de sangue e de lágrimas e “a
cal dos seus dias”, a escorrerem-lhe da alma, que dá forma e sentido ao poema.
E a Poesia fica sempre bem nas fotografias. do Poeta...
MC
MC
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