Estou cansada de dias sombrios, "amortalhados" em chuva e noites tumultuadas por ventos em desatino.
A Poesia é Luz, é o alimento, o consolo e o embalo da alma. Por isso. Aqui fica um belíssimo poema de
“Hoje o dia é um dia chuvoso e triste
amortalhado
Naquela monotonia doente dos grandes dias.
Hoje o dia...
(a pena caiu-me das mãos)
Acabou-se o poema no papel.
Cá por dentro
Continua...
Oh! este marulhar das almas no silêncio!”
Num
lampejo estranho, filtrado pela cortina translúcida da chuva, já não é o
guarda-chuva, partido e esgaçado, que vejo ali, ao canto da rua. Mas. Um ser
humano, um cão, um gato... Abandonados! Porque são velhos, porque dão trabalho,
porque dão despesa, porque fazem barulho e como não podem lavar-se, porque
cheiram mal.
O
ser humano, o cão, o gato... Incomodam! Pesam! Enervam! O velho chora, grita,
resmunga baixinho. Sempre! O cão ladra, gane, uiva. O gato mia, miados agudos,
roucos, doridos. Não se calam! Não dão sossego! Não morrem!
Por
isso. Também eles são abandonados, num desligamento lasso, impaciente,
indiferente. Como o guarda-chuva inútil, destroçado pela ventania desbragada, revolta, num torvelinho enfurecido.
O
velho, que os ventos turvos da vida gastaram, morre de solidão, de desgosto,
talvez também de doença, no asilo, no lar. Mas. Morre-se mais de mágoa! O cão,
o gato morrem na auto-estrada onde os deixaram. Ali, no abismo da morte certa!
Atropelados no encandeamento do seu espanto e desorientação, ou no
atoardoamento da sua amargura e saudade, à espera do dono que, esperam e acreditam, vai
voltar. Já, já!
A
Esperança, luz vacilante e débil, é o que resta quando se perdeu tudo, quando
nos tiram tudo, quando a morte é a única porta que se abre, o único fulgor na
vida...
A
escrita é perigosa! Comecei este texto com chuva e Poesia. Mas. Num
aturdimento, dou comigo, no avesso de mim,
a mergulhar os meus olhos, a enterrar o meu coração, a assombrar a minha
alma, no lodo insondável, infecto e viscoso da miséria humana!
Não escrevo poemas. Não escrevi, hoje, um poema. Mas. Se soubesse como o escrever, também não o teria acabado. Uma infinita pena tê-lo-ia amarfanhado, no meu coração, num calamento de incêndio esmorecido, mas latente. Nunca extinto! E. Acabar-se-ia, no papel, o poema acorrentado.
Oh! Este grito mudo, este desconcerto, este estremecimento febril, amotinado da minha alma, na silenciosa monotonia da chuva que cai, imparável, cai!
“Oh!
este marulhar das almas no silêncio!”
MC
4 comentários:
Também começo a sentir-me cansada destes dias.
um beijinho
Gábi
Hoje, brilha um sol tímido, Gabí. Gostei muito que a minha "Chuva" te tivesse trazido até mim! Beijinho.
A chuva continua... mas ficou um belíssimo texto!
A poesia também se instala em textos de chuva.
Gostei imenso deste texto.
Zé
Obrigada, Zé!
Porque sou um bocadinho vaidosa, gosto muito da generosidade linda, dos seus comentários!Ultimamente, para minha alegria, têm estado uns dias radiosos de sol, que por si só, são a mais bela e deliciosa Poesia.
Abraço grande, querido Amigo.
Enviar um comentário